Tempo Rei

Deve ter alguma coisa errada com minha memória. E acho que estou sendo otimista quando digo "deve ter". Jurava que havia escrito crônicas nos meses de julho, agosto e setembro mas, quando entrei no blog, verifiquei que a última é de junho. Pra dizer a verdade continuo achando que o provedor sumiu com as minhas crônicas dos últimos três meses. Mas, para ter certeza, precisaria me lembrar quais eram, pelo menos os temas. Aí, já viram né...

Na introdução do seu divertido e franco livro autobiográfico o lendário alucinado Ozzy Ousbourne, cantor da banda britânica Black Sabath, comenta: "Diziam que eu nunca seria capaz de escrever este livro. Bom, que se fodam ― porque aqui está ele!". Na página seguinte, apenas a frase: "Porra, não lembro de nada!". Palavrões à parte - uma das marcas do "príncipe das trevas" - o livro é ótimo! Com a ajuda de um jornalista amigo ele conseguiu narrar todas as inacreditáveis peripécias de sua vida. Como quando, pra citar um caso, fez um bolo de haxixe (um derivado das flores de maconha) e deixou esfriando na cozinha. Saiu pra dar uma volta de quadriciclo por sua fazenda no interior da Inglaterra. Nisso chega o padre anglicano local, amigo da família, como não tinha ninguém em casa viu o bolo e comeu um bom pedaço. O resultado é que ele - o padre - apareceu nu na paróquia no centro do povoado. O escandalo foi grande e Ozzy teve de intervir se reponsabilizando pelo ocorrido para que o padre não fosse excomungado!

Aos 75 anos, com saúde bem frágil - sofre do Mal de Parkinson e, para complicar, sofreu em 2019 um grave acidente em casa que afetou coluna e pescoço, tendo de passar por diversas cirurgias - gravou em 2022 o ótimo disco "Patient Number 9", que teve a participação dos grandes guitarristas Jeff Beck (falecido em 2023), Eric Clapton, Tony Iommi, Zakk Wylde e Mike McCready (Pearl Jam). Sua esposa Sharon disse que este ano que ele vai fazer dois shows de despedida para os fãs, em que pese os problemas físicos e de memória.

Enfim, tem sido uma época complicada para quem, como eu, vive cercado de música. É que meus ídolos lá dos anos 60 e 70 estão aos poucos se despedindo das atividades, realizando tours de despedida, embora nem todos admitam isso. Há algum tempo venho - quando possível - assistindo a esses acontecimentos. Roger Waters o gênio do Pink Floyd está com 81 anos e fez um espetáculo impactante no Maracanã. O mesmo com Paul McCartney, 82 anos. Também ano passado foi a vez de Steve Hackett (74 anos, este ainda "jovem"), o querido guitarrista do Genesis ali no Vivo Rio. Em janeiro deste ano, Chico Buarque (80 anos) no mesmo local. Mês passado o privilégio de ver Bethânia (78) e Caetano (82) juntos. Não há muitas esperanças de vermos outra vez este pessoal, embora possam eventualmente ainda realizar apresentações, mas serão cada vez mais escassas por motivos óbvios. Milton Nascimento já se despediu definitivamente dos palcos. Neste último Rock in Rio eu não fui, mas meu filho Vinicius me representou sobretudo no show do Deep Purple, cujo cantor Ian Gillan está com 79 anos mas ainda bate uma bola nos vocais. Assisti pela TV. Ah! Não podemos esquecer dos Stones, ainda on the road! Um fenômeno que carece de explicação científica.

Ano que vem Gilberto Gil (82) vai realizar uma tour nacional cujo nome é "Tempo Rei - Última Turnê". Na divulgação ele diz que "é o tempo que manda na própria mudança, mudança é a única constante; o tempo sempre será rei: pertenço ao meu tempo e nesse sentido é só o tempo de minha vida". Espero poder estar presente em mais este momento mágico. Aliás percebo que aos poucos também diminui a minha adequação a grandes eventos. Seja por questões das finanças não muito bem ajustadas a esta época, seja pela idade mesmo, embora aos 6.5 eu seja um garoto se comparado a esses oitentões citados.

Mas nem tudo são pesares, apesar do tempo insistir em passar rápido e eventualmente levar antes da hora alguém mais chegado. Já disseram que envelhecer é bom mas significa também assistir os outros partirem. E outros assistirão a nossa. Cito Gil outra vez: depois é mistério. Até porque, cá prá nós, a outra opção - não chegar a ter cartão de estacionamento de idoso - não é uma boa ideia. Mas queria dizer que ontem eu eu minha esposa estivemos no show "MPB4 60 anos". Essa comemoração começou este ano e se estenderá até 2025, pois o quarteto foi formado na cidade de Niterói em 1965. Dois dos quatro componentes são os originais e já ultrapassaram os 80 também. O Miltinho, um deles, disse que o grupo está com a corda toda para realizar muitas coisas nos próximos anos. Então é isso, nem tudo é despedida nessa área. O show foi "nostálgico alegre" porque o repertório incluía aqueles clássicos da música brasileira que cantávamos em grupos de amigos de adolescencia, com um violão. Tipo "Andança": Olha a lua mansa se derramar (me leva amor) / Ao luar descansa meu caminhar (amor) / Meu olhar em festa se fez feliz (me leva amor) / Lembrando a seresta que um dia eu fiz / (Por onde for quero ser seu par). Se você conhece e cantou essa música nos "velhos tempos", visite o cardiologista regularmente, faça aeróbica e musculação na academia e não esqueça de beber água. Ok um pouco de vinho e cerveja também. O que vale é aproveitar o tempo rei e se precaver, na medida do possível.

Sobre a minha memória, vou anotar o tema desta crônica e conferir daqui a um mês se ela estará por aqui ainda. A desconfiança sobre uma possível armação para sumir com meus textos persiste. E não me venha dizer que essa preocupação é coisa de velho. Se conseguir confirmar, informo ao meu amigo Alexandre de Moraes para as providências cabíveis!

Comentários

  1. É meu amigo o tempo joga contra ou a favor? Crônica deliciosa de ler. E as que sumiram? Kkkkkk Abração

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  2. Olá . Ainda não cheguei na sua faixa etária mas espero chegar com a sua capacidade de observação e descrição pois adoro seus textos.

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    1. Obrigado por prestigiar esse espaço Jussara. E pelas palavras.

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  3. Amei o texto Marquinho!😍 Maria Adelaide Amaral nos alertou:"Envelhecer é contabilizar perdas". Mas tb concordo que a alternativa não é razoável. Vamos nos mantendo por aqui até qdo der.
    Tenho acompanhado tb, nostálgica, essas últimas turnês. Dá um apertinho no coração. A passagem do tempo se materializando.
    Mas a luta, sempre, continua!
    E a gente vai levando.

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    1. É isso Leila. Descreveu muito bem esse momento e os sentimentos que despertam. Como vc disse, vamos levando... Bj

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