Odete

Não acompanhei o assassinato da Odete Roitman. Quer dizer, assisti a primeira morte, lá pelos idos da década de 1980. Portanto não tenho condições de indicar de forma certeira quem foi o assassino desta vez mas, acreditem, eu acertaria! A bem da verdade via todas as novelas, isso ao longo da infância distante. Tipo Irmãos Coragem, início dos anos 70. Tempos idos, suburbanos, o que me faz lembrar que sou "carioca da gema". Quer dizer, mais ou menos. Ao longo das décadas essa expressão vem tendo mudanças em seu significado. Atualmente prevalece a noção de que trata-se do carioca filho de pais cariocas. Neste caso eu seria "carioca da clara". Uma das teorias anteriores era que o termo era indicado para quem nasceu nos bairros mais antigos do Rio, datados do Século XIX, pelo menos. Neste caso tô dentro. Não que tenha nascido em  mil oitocentos e alguma coisa... Foi em 1959, o Rio ainda era a capital do Brasil. Hospital Dom Pedro II no distante subúrbio de Santa Cruz. Ok, para todos os turistas e maioria dos perenes habitantes da Zona Sul, é questionável o que consta em minha certidão de nascimento. Para esses o Rio começa no Museu do Amanhã, pega o lindíssimo Aterro passando pela Glória, Catete, Laranjeiras, Flamengo,  Botafogo... atravessa o túnel e aí é do "Leme ao Pontal", até porque não há nada igual mesmo. E fim da linha. No máximo chega ali no limite litorâneo da área das Guaratibas (Pedra de Guaratiba, Ilha de Guaratiba e Barra de Guaratiba). Dali em diante é Campo Grande e adjacências. Outro universo paralelo. Como dizem, "é longe do Rio". Aquela parcela que conhece a Av. Brasil apenas no trecho que liga o Centro à Ilha do Governador, onde está o Aeroporto Internacional Tom Jobim/Galeão. Nada contra, diga-se de passagem. Quem pode, pode e que aproveite ao máximo essa excelente vantagem e oportunidade. Mas é fato que, literalmente, o Rio é uma cidade dividida por uma cadeia de montanhas e por montanhas de desigualdades. Como de resto, o país. Só que na Cidade Maravilhosa isso torna-se mais facilmente perceptível. Mas isso é papo pra outra hora.

Voltando às novelas, acho que a última que  lembro de ter acompanhado foi Mulheres Apaixonadas e isso deve ter uns 25 anos. Mas o que sempre me marcou mais eram os discos com as trilhas sonoras, verdadeiros marcos musicais de nossa linda juventude. Extremamente ligado à audiovisual, hoje meu tempo noturno livre é mais focado em livros, música, filmes e séries em Streaming. Inclui-se nesse caso adaptações muito bem realizadas de obras literárias que há tempos atrás seria impossível realizar. Cito como exemplo duas trilogias geniais: "Fundação" de Isaac Azimov e "O Problema dos Três Corpos" de Cixin Liu.

De certa forma essas adaptações avançam em temas que proporcionam mais reflexões e não apenas um passatempo. Esta semana - aproveitando a necessidade da recuperação de breve indisposição, o clima frio e a possibilidade de resolver pendências de forma online - resolvi maratonar a segunda temporada de "Fundação" e me deparei com o seguinte pensamento por parte de uma "humanoide" com mais de mil anos: 

"Uma vez por dia eu ando por nossos jardins.

Sigo sempre o mesmo caminho.

Através do pomar, pelo labirinto.

Imaginei por anos que minha mente fosse assim.

Unidirecional. 

Com um só caminho certo.

Mas ultimamente eu tenho me deparado com uma gama de escolhas.

Vejo que minha mente é um labirinto agora.

Multidirecional. 

Ramificada.

O que levanta a dúvida se tenho a responsabilidade de descobrir cada escolha possível, por mais remota que seja.

E agora que percebi isso, sou obrigada a descobrir e avaliar cada caminho possível? Andar por um labirinto de possibilidades? 

Eu não sei. E isso me causa muita aflição."

Vejam só. Questionamentos de uma androide ficcional que servem para qualquer um. Se bem que nem sempre isso é bem-vindo. Não poucos filósofos acreditam que o não questionar é uma bênção. Ou, como diria o Zeca, deixa a vida nos levar. Mesmo assim, qualquer semelhança com as encruzilhadas e escolhas que fazemos ao longo da vida não terá sido mera coincidência. Desde a opção de mudar do longínquo subúrbio que forjou a nossa história até a de não mais assistir novelas, pra ser bem superficial. Mesmo que isso signifique não poder opinar sobre quem matou Odete.

Postado por Marcos Oliveira em 10/10/2025

Comentários

  1. O que acha da ideia de dividir o Rio em diversos municípios?

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    1. Tokyo funciona dessa forma. São diversas cidades juntas formando uma só. De certa forma isso já existe com as Regiões Administrativas e Subprefeituras. Fico imaginando as cidades que surgiriam. Por exemplo “Rio Sudoeste” seria a atual Barra. Essa Miami tupiniquim teria de abranger, além da área nobre dos Shoppings, todas as comunidades e bairros do espaço geográfico da baixada de Jacarepaguá: Cidade de Deus, Muzema, Rio das Pedras, Gardênia Azul, etc. Isso aconteceria em todos os novos municípios de sua ideia.

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  2. Rapaz eu tentei ler o primeiro livro da trilogia do Caso dos Três Corpos e no meio começou a complicar. Não entendi nada! Desisti.

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    1. Rsrs... Em matemática a resultante é caótica. Me refiro ao Problema dos Três Corpos. O autor, o chinês Cixin Liu é matemático, aí a coisa complica. Sugiro acompanhar a série na Netflix. Neste caso a complexidade foi bem aliviada. :)

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