Copacabana Palace

Não viajei neste mega feriado que pode chegar a 10 dias se você puder emendar com o próximo final de semana. A China tem um feriado anual desse tipo. Bem, nós temos o carnaval. Espero que você tenha podido fazer aquele passeio que estava planejando há tempos. Por outro lado, ficar em casa - por impossibilidade ou por opção - não é mau negócio. Finalmente o outono chegou com suas belas nuvens, temperaturas amenas e pancadas de chuvas inesperadas. A mais bela estação do ano. Ler um livro, ver filmes, ouvir música. Sem necessidade de ligar o ar condicionado e levar um susto quando a conta chega. O trânsito também fica bem tranquilo.

Começo a escrever na manhã deste dia nublado. O sino do igreja que vejo da janela de minha sala acaba de soar nove badaladas, vindo de sua grande torre. Já choveu mais cedo. As nuvens pesadas indicam que vem mais por aí, embora o sol vá e volte, insistindo em se fazer presente neste sábado de aleluia. Quando criança, saíamos pelo bairro pobre para fazer a malhação do judas. Sempre tinham alguns pendurados em postes. Com um cartaz indicando o nome da vítima da vez. Normalmente algum político ou comerciante avarento. Depois do meio dia arrancávamos o boneco mal ajambrado e fazíamos a nossa justiça com as próprias mão. O linchamento incluía pancadas no pobre coitado antes de tacar fogo no mesmo. Não tenho ideia se essa tradição ainda existe em algum canto distante, mas seria bom esquecer dela. Melhor fazer a Vigília Pascal, parte final do Tríduo Pascal da fé Católica. Mais fé e esperança e menos sentimento de vingança.

Entre as tarefas que me deleguei neste início de feriado está uma que é execrável para muitos: lavar o carro. Pior: dar uma geral por dentro e por fora, incluindo encerar. Já passaram cera no carro? Não aconselho a tarefa. Houve um tempo em que os livros de autoajuda eram moda. Hoje existem os "coachs" nas redes sociais e nos retiros. Me incluam fora dessa. Mas confesso que li alguns desses manuais de sobrevivência emocional em dez lições. Tinha uma série que tomava como base os eventos do cotidiano, tipo "A Arte de Andar de Bicicleta". Eu poderia lançar "A Arte de Lavar o Carro". Enquanto passo o aspirador, jogo água (sem desperdício), aplico silicone e cera, vou meditando sobre o significado da vida e o que há além dela. Papo furado. Liguei o som e fiz o trabalho. Bem, não deixa de ser um bom momento. Por causa da música. O tempo passa e nem percebo.

 Abro o porta malas e encontro um livro esquecido lá no fundo. Deve ter sido da última viagem. Trata-se de "Os Guinle - A História De Uma Dinastia" de Clóvis Bulcão (Editora Intrínseca, 2015). Conta a surpreendente trajetória dessa família de origem francesa desde a chegada do patriarca ao Brasil no século XIX até o fim da dinastia capitalista bilionária em meados do século XX. O clã deixou sua marca no país em tudo que se possa imaginar: portos, comunicações, petróleo, arquitetura, hospitais, cultura, etc. E ainda cravaram sua marca no que havia de mais sofisticado no jet set ("a comunidade internacional das pessoas de posses, habituadas a frequentar lugares exclusivos") mundial.

Na época comprei esse livro sobretudo para saber um pouco mais da família que teve a visão de construir o Hotel Copacabana Palace no momento exato (1923) de colocar o Brasil no mapa mundi do turismo e para atender as demandas de visitantes estrangeiros na então capital da República. Acabei descobrindo que a família construiu também a Granja Comary, o Hospital Gaffrée e Guinle e muito mais. Além da arquitetura e da localização, me atrai a história dos eventos ali realizados e figuras históricas do cinema e da música internacional que ali se hospedaram ao longo de cem anos de história. 

O projeto é do francês Joseph Gire, que teria se inspirado em dois hotéis famosos da Riviera Francesa. Em seu interior há uma profusão de mármore de Carrara, cristais da Boêmia e raros granitos de diversas partes do mundo. Não que eu já tenha me hospedado lá, que fique claro. A bem da verdade nunca entrei. Mas por muitas vezes parei naquela calçada em frente para admirar. Não se trata de um encantamento por vida de milionário. Tem a ver, como já dito, com a história e beleza da obra. O outro edifício famoso de Copacabana é o residencial Chopin, cujo destaque principal é - além de se localizar na Av. Atlântica - o fato de estar ao lado do Copacabana Palace! Caso você se interesse, informo que dei uma olhada nos preços da estadia. Com sorte se acham acomodações por R$ 3.500,00 a diária, no anexo. Mas, se quiser a luxuosa suíte de cobertura (a dos artistas), prepare-se para um valor a partir de 30 K (significa R$ 30.000,00)!

Bem, retorno ao meu labor deste sábado. Deixo o livro em cima da mesinha de ferro do pequeno jardim, fecho a tampa do porta-malas e vou aplicando a cera em spray para em seguida passar um pano seco de microfibra, seguindo as recomendações do fabricante. As nuvens brancas de outono dividem o espaço com o azul. Amanhã é Páscoa, vou a missa das 9:00 h. Segunda é feriado. Quarta é outro. Talvez o Copacabana Palace esteja lotado. Na próxima oportunidade que for ao bairro mais uma vez vou dar uma parada em frente ao hotel. Enviarei essa crônica para o WhatsApp deles. Quem sabe se eu me identificar o gerente tenha lido esta crônica e me convide para tomar um café expresso no hall de entrada...

Comentários

  1. Brilhante, Marcos. Não gosto de lavar o carro não. kkkk. Gostei da história do hotel. Tomara que possa se hospedar lá!

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    1. Obrigado Josué. Tomara que vc possa ir. Quanto a mim, acho que só na próxima encarnação, como diz aquele velho ditado. :)

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  2. Três mil.o quarto mais barato? Sou pobre mesmo

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  3. Como é bom ler seus textos, poderia ser mais constantes , me identifico logo...

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    1. Valeu Gafa! Coisas do nosso cotidiano sob um olhar "impressionista". :) Abraço!

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  4. Chuva inesperada, com muito vento, relâmpagos e trovões de madrugada.
    Lamento um pouco o desaparecimento de tradições folclóricas/populares como a malhação de Judas, embora ache o personagem bíblico injustiçado (apenas cumpriu um papel sem o qual, para os cristãos, Jesus não garantiria a salvação para a humanidade).
    Esse livro sobre os Guinle é muito interessante. Há um documentário também, com participação de Clóvis Bulcão.
    Estou entre os que detesta lavar carro.
    Parabéns pela crônica!

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    1. Realmente a tempestade desta madrugada foi bem forte. As águas de março chegaram em abril. Vou procurar esse documentário que vc citou. Valeu!

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    2. Acabei acertando quando falei das pancadas de chuva inesperadas...

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  5. Bom dia! Ótima crônica Marquinho. Sabia que o hotel "oferece" um café da manhã aberto ao público? Nunca fui mas tenho vontade de conhecer o interior desse monumento arquitetônico do Rio de Janeiro. Grande abraço!

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    1. Obrigado amigo! Não sabia desse detalhe do café. Valeu pela dica. Grande abraço!

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    2. Rapaz, pesquisei. Olha aí: "Nosso café da manhã é aberto ao público e é servido no restaurante Pérgula. O valor é R$ 225,00 + 10% por pessoa. De 7 às 11 hs". Não é caro. Eu que estou com pouco dinheiro. Rsrs...

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