O Comediante

O início de minha carreira profissional foi literalmente a céu e mar abertos. Em plataformas marítimas de exploração de petróleo, a mais de 100 km do litoral. Depois de longo tempo o panorama mudou completamente e passei a ver a natureza só pela janela lateral do escritório. De cara para um computador a maior parte do dia, da semana, do mês, dos anos. Mas dei muita sorte. Éramos uma dúzia de amigos, não apenas colegas de trabalho. E a marca registrada era o bom humor, além do apoio mútuo. Imagine passar 8 horas do seu dia em um ambiente que não lhe agrada muito. Não era esse o caso, pelo contrário. Felizmente.

Falei do bom humor da equipe e isso é fundamental para um trabalho produtivo e criativo. Eventualmente parecia que estávamos de volta a quinta série, com aquelas piadinhas e brincadeiras típicas. De todos, um se destacava por sua agilidade em criar situações engraçadas, comentários irônicos pertinentes, rápidas sacadas, capacidade de agregar as pessoas. Vivia sacaneando todo mundo. Os que eram suas "vítimas" riam com ele. Ninguém resistia. Tenho saudades de todos, sobretudo deste querido amigo que partiu prematuramente. Com certeza alçou muitos degraus em sua escala evolutiva e cito isso por que, além de tudo, era um sujeito espiritualista.

Esta semana lembrei dele por causa de um vídeo que me apareceu no Threads. Procuro me policiar para não ficar muito tempo preso nas redes sociais, que são efetivamente uma armadilha, a não ser que você as tenha como componente de sua vida profissional, fato corriqueiro atualmente. Por outro, além da questão profissional, elas podem trazer muitas facilidades, desde que se saiba driblar e influenciar os algorítimos - e não o contrário.

O vídeo que me surpreendeu é de um senhorzinho de 74 anos. Ele é de Houston, Texas, EUA. Estava em um bar fazendo uma stand-up comedy. A sua linha de humor era explorar aquilo que ele mais dominava: a própria idade. Não são muitos humoristas nessa faixa etária fazendo stand-up teatrais. O caminho é não se levar a sério e rir das próprias limitações impostas pela idade, bem como o modelo de relações sociais que vai se modificando com o passar dos anos. Nesse aspecto o respeitável senhor - sentado em uma cadeira, tendo em uma das mãos o microfone e a outra usando a haste do mesmo como apoio - levava o público às gargalhadas com as histórias de seu momento atual.

Contou que se inscreveu em um desses sites de relacionamento, neste caso chamava-se "Datação por Carbono". Conheceu uma jovem da mesma idade dele (7.4). Pediu-lhe que passasse o seu número. Ela respondeu 14 por 9! Para os jovens (mais reais) que estejam lendo essas linhas e não entenderam a piada, ele pediu o número do celular mas ela passou um tipo de acompanhamento que muitos idosos tem de fazer: a pressão arterial! Nesta mesma situação ele se dizia aliviado em namorar uma pessoa de 74 anos ou mais. É que não teria de se preocupar com a opinião dos pais dela... Um amigo lhe perguntou se gostaria que fosse inscrito no programa "Adote um avô". Ele concordou. O resultado é que agora ele tem que cuidar de um de 95 anos! Mas a coisa não para por aí. Como tem uma limitação para caminhar, e com medo de tropeçar, resolveu passar a utilizar um capacete. Como as pessoas começaram a olha-lo de um modo estranho, resolveu então comprar um skate e passou a andar com ele embaixo do braço, afinal ninguém estranha um skatista. Em determinado momento perguntou para a plateia se tinha ali um jogador de videogame. Ele disse que também jogava. Jogo de velha. Até as 19 horas. No Facebook fez teste que determinava qual era o seu "animal espiritual". O resultado foi "animal extinto". Já sobre a expectativa de vida, é fato que as mulheres vivem em média até os 81 e os homens até 76. Como ele está com 74, planeja fazer a transição de sexo este ano para poder entrar no time feminino! Verdadeiramente, uma comédia.

Acredito que meu interesse especial sobre essa figura com um astral tão pra cima tem a ver com o fato de que no próximo mês ultrapasso a barreira dos 65, chegando ao 6.6. Ficarei a apenas 9 anos de distância dele. Me lembro, quer dizer mais ou menos, que em 1966 quando o Brasil não ganhou a Copa na Inglaterra houve um clamor e uma mensagem: rumo a 70! Realmente em 1970 chegamos ao tricampeonato com aquele time incrível. A partir de abril pegarei o rumo 70. Espero ter o mesmo sucesso vital daquela seleção e que esteja com o bom humor deste texano. O mesmo para todos os meus caros amigos e amigas que porventura estejam em situação semelhante.

Comentários

  1. Kkkkkkkk rindo muito aqui! Gostei desse humorista. Também estou nesse time rumo aos 70 parabens pela crônica Marquinho são sempre ótimas

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  2. Ainda não estou nessa faixa, mas quase. Como mulher isso me preocupa. Mas o bom humor é que tem prevalecer, não se levar muito a sério, cuidar da saúde e fé em Deus. Adoro ler seus textos.

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  3. Muito bom Marcos! Realmente minhas memórias dos tempos laborais também são cobertas de figura hilárias! Kkķkkk!!!

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