Tentando viver no momento presente

Hoje acordei, levantei, atravessei o closet, entrei no banheiro e fiquei com preguiça de tomar um banho. Resolvi então lavar o rosto e escovar os dentes.
Saí do banheiro, cheguei no quarto e deitei mais um pouquinho. Depois de alguns minutos levantei, atravessei o closet, entrei no banheiro, fiquei com preguiça de tomar um banho. Resolvi então lavar o rosto e escovar os dentes.
Epa! Algo estranho. Porque estou repetindo frases na crônica? É que aconteceu mesmo! Só me dei conta porque alguns segundos antes de escovar os dentes pela segunda vez, senti o sabor da pasta.
Apesar de parecer, não é Alzheimer, ainda.
O que houve então? Perda momentânea de contato com a realidade? Nesse caso um Neuro é indicado e talvez uma tomografia seja recomendável. Não. Não é bem isso.
Tenho percebido, e isso não é de hoje, que faço as coisas pensando em outras. Aquela velha história, bem conhecida, do piloto automático: você chega ao local para onde estava dirigindo e nem se lembra do percurso que fez.
É o pensamento voando o tempo todo. Pouca atenção no momento presente quando se trata de tarefas corriqueiras. Isso é uma vantagem pois enquanto se faz uma coisa vai se encaminhando soluções e programações de outras.
Mas não é tão vantajoso assim quando ultrapassa certo ponto.
Outro dia eu fui comer uma banana. Depois fiquei em dúvida se já tinha comido ou não. Se fosse tangerina ela deixa rastros por algumas horas mas banana nem tanto. Resultado é que fui procurar na lixeira se tinha alguma casca recente... E se fosse um remédio?
Provavelmente ao comer a fruta eu estava pensando em alguma pendência a ser resolvida. E nem degustei a "pseudobaga da bananeira, uma planta herbácea vivaz acaule da família Musaceae que são cultivadas em 130 países" (copiei da Wikipedia), que eu havia comprado na feirinha da roça, que funciona as terças e sextas em uma praça aqui perto de casa. Viram? Não esqueci: não é Alzheimer mesmo!
No sábado, conversando com um grande amigo, ele me contou o relato de uma terapeuta. A filha dela é Barista, profissional com formação, especializada em cafés de alta qualidade. "Mamãe, vou te preparar um café especial, vai adorar!". Quando se deu conta ela já estava lavando a xícara e nem se lembrava que já havia tomado o café, muito menos o sabor que tinha. A experiência, o momento, foi perdido.
Aí entra o problema. Não estar presente. Não viver o presente. Há milhares de anos os orientais batem nessa tecla. E nomes importantes, como o psicólogo, jornalista e escritor Daniel Goleman, vem trazendo o tema para os dias atuais.

E a coisa tem mesmo piorado nesses tempos, sem tempo, corridos e corroídos.
É a multitarefa, são as redes sociais, é a agenda lotada, as pendências a resolver, as contas a pagar, os prazos, as pressões, divagações, ansiedade... A mente fica lotada e vai tentando dar conta de uma coisa enquanto o corpo faz outra. Aí não aproveitamos o momento, não sentimos o tempo, não lembramos o que fizemos, a ansiedade aumenta pois tendemos a pensar mais nos problemas de hoje e de amanhã.
Para quem se identificou, não esperem que eu dê uma solução por aqui. É que estou pensando em outras coisas enquanto escrevo, o que provavelmente vai fazer com que essa crônica não fique lá grande coisa. Ainda bem que não é grande mesmo. O máximo que posso fazer é indicar um link de um interessante podcast chamado Autoconsciente que trata do tema de uma forma em que dá para prestar atenção. Até porque os episódios são relativamente pequenos. É da Regina Giannetti que me avisa: "tenho muito em comum com você. Também sou afetada pelas situações que hoje afligem a humanidade: a avalanche de informações, a correria do cotidiano, as adversidades que aparecem sem aviso, a montanha-russa emocional que é viver em nosso acelerado e instável mundo. A vida é como um turbilhão que nunca pára e nos arrasta junto". Ao final o objetivo é amenizar a agitação mental e a falta de atenção no momento presente.
Enquanto isso ouço música New Age, tento algumas leituras interessantes e busco iniciar um trabalho de meditação, se tiver tempo. Bem, pode-se fazer meditação em 10 minutos. Então tenho esse tempo. Difícil é prestar atenção na respiração se fico pensando se amanhã vai chover ou se vai sobrar mês no final do dinheiro.



Mychael Danna - "Sky 7"